CONFIRA OS TEXTOS: |
MAIS LIDOS ![]() |
DESTAQUES ![]() |

SOCIEDADE DA BIBLIOTECA POPULAR DE VERSAILLES1
(Sessão pública)
Discurso do Sr. PAUL JANET
(do Instituto)
Da união das classes
Senhoras e senhores,
Devo começar por pedir-vos perdão se, chamado para vossa Sociedade para pronunciar aqui algumas palavras, não ousei confiar ao acaso a minha fala, e se dou à nossa conversa um ar bastante inoportuno de solenidade trazendo-vos um discurso escrito. A palavra viva e livre tem, eu sei, mais charme e bem mais entonação do que a preparada. Porque fiz então dessa maneira? Vou dizer-vos. Meditando sobre a pequena alocução que deveria fazer para vós, imprudentemente peguei a pluma para fixar minhas ideias e colocar algumas no papel. A pluma então fez mais do que lhe pedi. Ela escreveu um discurso, enquanto eu só queria fazer algumas anotações. O mal feito, o que me restou? Recitar para vós o meu discurso, fazendo-vos crer que improvisava, ou lê-lo para vós; preferi a segunda opção, menos agradável, mas mais sincera, e peço-vos que me escuseis.
A origem das minhas reflexões, senhores, foi a própria reunião para a qual fui chamado. Essa reunião é a festa anual de uma Sociedade que busca colocar a instrução e a leitura à disposição de todos, e que chama a essa festa pessoas de todas as condições, de todas as classes. Eu via aqui, pois, um exemplo vivo e falante dessa união e concórdia que todos os bons espíritos desejam ver estabelecer-se e espalhar-se mais e mais entre todas as partes da sociedade; e, tirando daí uma moralidade geral, dizia-me que, se ainda existem classes em nossa sociedade nivelada, o que é de duvidar, é à boa vontade dos indivíduos, a seus próprios esforços, a seu entendimento e à sua confiança recíproca que cabe destruir as últimas barreiras que ainda nos separam uns dos outros. O problema chegou ao ponto em que a lei nada mais pode, ou quase nada, e em que tudo depende dos esforços livres e permanentes de cada um e do acordo de todos. Parece-me que pode haver aí um ponto útil a esclarecer e a colocar sob a luz.
Existem, senhores, duas espécies de desigualdades: as desigualdades de classes e as desigualdades individuais. As primeiras são odiosas e devem ter desaparecido nas sociedades esclarecidas; as segundas são justas e inevitáveis. Essa distinção é muito importante e pode servir para esclarecer muitas dificuldades. Muitas vezes acreditamos que as desigualdades de classes subsistem ainda porque as desigualdades individuais permanecem e permanecerão sempre. Como em todas as sociedades, mesmo as mais equitativas, há uma série infinita de graus e uma partilha de todas as condições possíveis de existência, pode-se dizer, reunindo livremente um conjunto quase semelhante de situações, comparando-o a outro grupo formado da mesma maneira, principalmente se se der a esses dois grupos nomes diferentes, pode-se acreditar, digo eu, que estamos diante de duas classes diversas e desiguais. Suponhamos agora que, em certas circunstâncias, os interesses desses dois grupos possam ser diferentes; cada um puxando para o seu lado, o que é comum na natureza humana, essa oposição poderá se tornar discórdia, rivalidade, e os preconceitos de classes renascerem, mesmo que no fundo toda distinção real tenha desaparecido. Todavia, estudando mais de perto as coisas, admitimos que estamos sob o império de uma ilusão, e chegamos aos três resultados seguintes: 1º não são mais as desigualdades de classes, mas as desigualdades individuais que, mal compreendidas, podem ainda levar a crer em falsas distinções; 2º as classes, que não existem legalmente, podem no entanto renascer por preconceitos recíprocos; 3º o remédio para esses preconceitos está na boa vontade e na confiança recíproca; cabe ao próprio sentimento curar os erros e as feridas do sentimento.
As desigualdades de classes existem em uma sociedade, senhores, quando há certas vantagens sociais que, por força da lei (não das circunstâncias), são absolutamente interditas a certo número de homens; e, reciprocamente, quando certo número de cargas são impostos pela lei (e não pelas circunstâncias) a certa classe de cidadãos em detrimento de uma outra. Por exemplo, se há uma classe social à qual se proíbe, pela lei, a família, a propriedade, a educação, ou, o que é pior, que seja ela mesma considerada uma propriedade, esse estado de coisas é o que se chama escravidão. É o mais baixo degrau da desigualdade. Suponhamos uma classe à qual não se proíba a família, nem mesmo de modo absoluto a propriedade, mas que não poderá ter posses senão em certas medidas; que estará ligada à terra e não poderá dela se apartar; que não gozará do produto de seu trabalho, e teremos a servidão.
Suponhamos agora classes sociais isentas de impostos, únicas a poderem elevar-se aos cargos públicos, às patentes do exército, possuidoras de uma parte do solo de forma inalienável, únicas a gozar do direito de caça, de pesca, etc., cobrando rendimentos por todas as utilidades da vida; suponhamos outras, possuidoras exclusivas dos direitos políticos; outras sendo as únicas detentoras do direito de praticar sua religião. Suponhamos, ao contrário, outras classes excluídas inteiramente ou em parte do direito de propriedade, do direito de trabalhar e de se apropriar dos rendimentos de seu trabalho, do direito de ir e vir, etc.; suponhamos, enfim, os inumeráveis privilégios e proibições que constituíam o que chamamos de antigo regime, e saberemos o que é desigualdade de classes. Ela consiste essencialmente, repito, no fato de serem atribuídas, por força de lei, certas vantagens a uns e a outros certas cargas de maneira completamente arbitrária, ou antes consagrando as desigualdades primitivas que resultam do direito do mais forte.
Coloquei em evidência, senhores, as grandes desigualdades de um outro tempo, que desapareceram diante da Revolução Francesa. Certamente não quero aqui percorrer todas as leis, uma a uma, para ver se não restou algum vestígio de desigualdade de classes, e entendo por isso algumas vantagens ou algum encargo constituídos precisamente pela lei e que podem desaparecer com ela. Evidentemente as desigualdades capitais desapareceram, e se ainda restar delas qualquer vestígio do mesmo gênero, a boa vontade evidente da sociedade será bastante para fazê-las desaparecer, pouco a pouco, pois as busca em toda parte com zelo, e de comum acordo para nivelar as asperezas que podem restar ainda na legislação que as sanciona.
No entanto, senhores, quando a lei tenha suprimido todas as desigualdades que haja sancionado, não significa que elimine a desigualdade, pois restam ainda as desigualdades naturais. O verdadeiro progresso consiste em eliminar as desigualdades artificiais para deixar agir as desigualdades naturais. Seria erro, em sentido inverso ao que cometia o antigo regime, substituir as desigualdades naturais por uma igualdade artificial, que não poderia manter-se senão comprimindo todas as forças dos indivíduos, aniquilando, por isso mesmo, o impulso do progresso social.
Quando se eliminou da própria lei toda desigualdade, ter-se-ia tudo feito? Nesse ponto as escolas políticas se dividem: umas acreditam que é preciso deixar ao indivíduo a mais ampla liberdade e responsabilidade possíveis, sem intervenção de nenhuma forma3; que, pelo só fato do desenvolvimento espontâneo dos indivíduos, as desigualdades naturais irão sempre se aplainando; outras creem, ao contrário, que o poder deve facilitar e acelerar esse movimento intervindo tanto quanto possível para ajudar os fracos e colocá-los em estado de desenvolver sua energia individual.4 Não é assunto meu examinar essas duas doutrinas, pois vim aqui para conversar convosco e não para discutir sistemas. É suficiente dizer, e de ambas as partes todos concordamos, que após a supressão das desigualdades legais, resta ainda duas causas de desigualdade natural: 1º as faculdades do indivíduo; 2º as circunstâncias exteriores.
As faculdades do indivíduo, faculdades intelectuais, morais e mesmo físicas, suas aptidões, suas paixões, sua vontade, em uma palavra, seu caráter: eis uma causa evidente de desigualdade. Tomai, numa condição elevada da sociedade, dois irmãos que irão começar a vida exatamente com o mesmo capital, seja de fortuna, seja de educação. Um aumentará, em um degrau ou em muitos, seu capital e a educação de sua família; o outro dissipará seu capital e fará sua família descer muitos degraus na escala social. Eis dois homens nascidos em igual situação que, ao cabo de alguns anos estarão separados por muitos escalões. Se tomarmos o mesmo exemplo numa condição social inferior, também veremos tal indivíduo descer a um degrau ainda mais ínfimo, e tal outro, ao contrário, por faculdades superiores, elevar-se a um dos primeiros escalões da sociedade. Não é bastante frequente encontrar, entre nossos grandes artistas, homens nascidos numa condição bem humilde e muito pouco favorecida? O mesmo ocorre nas forças armadas de uma nação. Enfim, em nossos estabelecimentos de instrução pública, todos já vimos crianças da mais humilde origem tornarem-se os primeiros, por seu trabalho e por seu próprio mérito, entrar nas escolas e se elevarem acima de colegas de origem muito mais elevada.5
Evidentemente essas ascensões e quedas extremas não são fatos dos mais comuns, e, em geral, todos ficamos numa condição um pouco mais alta, um pouco mais baixa, mas em geral não muito longe do nível em que nascemos. No entanto, essas diferenças aumentam de geração em geração; o movimento se faz de alto a baixo; há penetração recíproca entre as camadas diversas da sociedade, e ao longo do tempo a igualdade se estabelece. Parece que as quedas, sendo mais fáceis que as ascensões, devem ser mais frequentes; no entanto, isso não passa de aparência, porque, em definitivo, o número dos mais favorecidos aumenta em vez de diminuir: o que não poderia acontecer se na realidade não houvesse mais ganho do que perda.
Uma segunda causa de desigualdade, independente da lei, são as circunstâncias exteriores, que ninguém pode obstar, embora certamente se possa com o tempo minorar sua ação. Essas circunstâncias exteriores são as condições que se impõem à vida humana; é absolutamente contraditório querer dobrá-las todas aos nossos desejos e às nossas vontades. A primeira e a que está menos em nosso poder, é o nascimento. Depende de nós nascer nos gelos do Norte, como os esquimós, ou sob o sol tórrido da África, como os hotentotes? Não, sem dúvida. Do mesmo modo, transportando-nos para nossa sociedade, não é falta de ninguém se um nasce ao fundo das montanhas, em algum vale distante de centros intelectuais, industriais, outro, em alguma grande cidade. Um terá menos luzes e menos desejos; outro, ainda que seja de menor condição, excederá em muito pelas luzes e pela inteligência; o convívio em uma grande cidade esclarecerá seu espírito, excitará seus desejos para além do seu meio: ele será ao mesmo tempo mais favorecido e mais infeliz. Multiplicai ao infinito, senhores, todas as circunstâncias nas quais podem se encontrar os indivíduos: o celibato ou a família, a saúde ou a doença, os eventos inesperados que abrem uma porta a um e a fecha a outro, etc. Distribuí essas circunstâncias entre todos os indivíduos que compõem uma sociedade, e vereis tantas situações quantas são as pessoas, e uma hierarquia de desigualdades se estabelecerá; de maneira que cada um terá alguém acima de si e alguém abaixo; alguns a quem evitará e alguns a quem invejará; e essa série não é unilateral: são séries que se cruzam, e mesmo que se invertem e se corrigem uma às outras. Existem muitos princípios de classificação: a fortuna, as funções, o valor pessoal, as luzes, a moralidade, a própria felicidade, que nem sempre se dá em razão das circunstâncias, mas em razão do caráter e mesmo da vontade. Daí mil séries diferentes de classificação: em uma nós somos inferiores, em outra somos superiores.
Está aí o gênero de desigualdade que subsiste e que subsistirá sempre mais ou menos em toda sociedade. Quanto às classes distintas, buscai reconhecê-las e limitá-las na sociedade atual, e não será possível. Cada um dos graus é tão próximo do grau precedente ou do que o segue, que é impossível encontrar em alguma parte o limite. Distinguir-se-á os ricos e os pobres? Então, onde estão os ricos e onde os pobres? Nas fileiras mais elevadas da sociedade encontram-se pobres, e nas mais modestas encontram-se ricos. Quantos artistas, médicos, cientistas, empregados, e mesmo grandes negociantes vivem da maneira mais penosa e mais dolorosa! Quantos, ao contrário, bravos camponeses trabalhando a terra não vedes no campo, sem saber ler nem escrever, e que têm não somente conforto, mas também fortuna!
Seriam então as funções públicas que constituiriam uma classe? Contudo, além dessas funções estarem abertas a toda gente, elas próprias são uma hierarquia que contém todos os graus, desde os mais simples aos mais elevados. O mais humilde desses graus seria considerado um privilégio com relação aos que não são da hierarquia, como por exemplo um grande artista, um rico milionário, um camponês bem dotado, ou mesmo um operário que ganha bem sua vida? Evidentemente não existe aí um princípio de delimitação e de separação de classes.
Seria a nobreza do nome? Mas que privilégio a nobreza dá hoje em dia? Aí está uma pequena vantagem, devida às circunstâncias, que vai ele próprio se diluir na massa das vantagens sociais em que cada um recolhe o que pode conforme seu mérito ou o favor das circunstâncias.
Num outro tempo, a distinção das classes poderia ter sido fundada sobre a desigualdade política; mas hoje os direitos políticos são comuns a todos, e não há nenhuma razão para separar os cidadãos em categorias. Hoje em dia não há deserdados em termos de direitos políticos senão as mulheres; e elas não têm se queixado muito disso. Um outro elemento de distinção é o trabalho. Dir-se-á: a classe trabalhadora e a classe burguesa. – Nada mais inexato do que essas denominações. Trabalha-se em todos os graus da série, no alto como no baixo. Um médico trabalha, um advogado trabalha, um ministro trabalha. Toda gente trabalha. Existem ociosos entre os ricos, é verdade, mas não há ociosos entre os pobres? A preguiça é de todos os graus, assim como o trabalho.
Tomar-se-á o trabalho manual como símbolo de uma classe especial? Se por um lado existem muitas profissões em que se trabalha com as mãos (o farmacêutico, o cirurgião, o pintor, o contador, etc.), por outro lado não há nada aí que constitua uma classe; trata-se de uma função em particular: eis tudo. Não há mais razão para se dizer a classe operária do que para dizer a classe médica, a classe letrada, a classe militar, a classe eclesiástica, a classe jurídica. São apenas ocupações diferentes, participações diversas na obra da sociedade. Não seria possível que todos fizessem a mesma coisa: por isso a diversidade no exercício de nossas faculdades. Todo trabalho é nobre. Considerar o trabalho das mãos menos nobre que outro, é alimentar um preconceito da antiguidade. Agora, que existam diferenças, seja de prazer, seja mesmo de importância nos trabalhos de uma sociedade, eu concordo. No entanto, trata-se de uma desigualdade que resulta das circunstâncias e não da lei, e não pode servir para caracterizar classes distintas.
Há, eu reconheço, um elemento que poderia servir ainda de motivo para a distinção, e que eu combato: é a educação. Aí, é preciso convir, ainda nota-se uma grande desigualdade na sociedade. No entanto, também é preciso reconhecer, a sociedade é cheia de boa vontade para remediar esse mal; ela faz todos os esforços e os fará cada vez mais para disponibilizar a todos os meios de se instruirem. Os indivíduos vêm de todas as partes em auxílio dos poderes públicos. É para esse lado que se devem volver todos os esforços. Aliás, está aí uma causa de desigualdade que está no poder de cada um destruir por si mesmo, e da qual, por conseguinte, não tem o direito de se queixar.
Portanto, seja qual for o lado pelo qual olhemos, não existe nenhum meio em nossa sociedade de constituir classes distintas. Existem grupos diferentes formados por diferentes ocupações; mas esses grupos são tão numerosos, misturam-se de tal maneira uns aos outros, que não se pode realmente separá-los.
E no entanto, ainda que pela lei não haja mais classes, elas ainda são mantidas pelo preconceito, pelo hábito, pela imaginação, pelo sentimento. Em uma palavra, as causas morais poderiam manter durante longo tempo as distinções apagadas pela lei, se o remédio não se encontrasse precisamente nas mesmas fontes que o mal.
Numa sociedade onde existiram grandes desigualdades por longo tempo, é inevitável que se criem hábitos e disposições que sobrevivam durante longo tempo aos costumes que já desapareceram. Uma lembrança das antigas castas está sempre viva, e nós transportamos essa ideia a situações inteiramente diferentes. Formando nossa sociedade uma série infinita de situações, em que cada uma seja desigual com relação àquela que a segue ou a precede, cortemos essa série mais ou menos pela metade; convenhamos que tudo o que lhe está abaixo constituirá a classe inferior, e tudo o que está acima a classe superior: a essas duas classes arbitrariamente formadas chamaremos a uma, por exemplo, de classe trabalhadora, a outra de classe burguesa; com palavras nós criamos classe, o que é uma das causas mais frequentes de erro para o espírito humano.
Correspondendo essas divisões a antigas lembranças, a antigos hábitos de espírito, serão facilmente adotadas pela opinião, e os antigos sentimentos continuarão a existir ou a renascer. As classes que foram por longo tempo oprimidas estarão sempre dispostas a crer-se oprimidas. O sentimento da dignidade, desenvolvido nelas para emancipação, facilmente tomará as formas da irritação e da ameaça. As classes melhor favorecidas, não pela lei, como dissemos, mas pela natureza das coisas, facilmente crer-se-ão ameaçadas. Estabelecer-se-á assim desconfianças entre dois grandes grupos sociais; haverá rivalidades e surdas antipatias. Abaixo, acreditar-se-á que um antigo regime reapareceu sob outra forma; acima, pensar-se-á numa revolução social que quer tudo destruir. Seremos tanto mais separados quanto menos o formos.
Esses mal-entendidos são funestos. Todos os moralistas sabem que os males da imaginação são os mais difíceis de curar. Pela lei foram destruídas as desigualdades reais, os privilégios, os trabalhos gratuitos obrigatórios, os encargos cívicos, mas a lei é impotente para unir os corações. Ora, enquanto uma desconfiança inveterada separar duas partes da sociedade, ela certamente será desgraçada, sem falar dos perigos reais que uma tal situação pode ocasionar à ordem e à paz.
Não quero dizer com isso, senhores, que não possa haver, em certos casos, rivalidade e antagonismo de interesses entre uns e outros. Nesse caso, discute-se, defende-se seus direitos, busca-se o entendimento. Mas esse é um fato comum e normal na sociedade. Todos os dias, na ordem do mundo melhor regulamentada, existem divergências de interesses entre os homens, há processos, há litigantes, mas a sociedade não está perturbada. Ela não o será então por divergências precisas e positivas relativas a interesses reais, mesmo que exagerados. Quanto a mim, longe de assustar-me com essas coalizões, dessas querelas entre patrões e operários, ao contrário vejo nisso um grande bem. Certamente mais vale para os operários discutir interesses reais de uma maneira precisa e positiva, do que vê-los silenciosamente inflamarem-se por teorias quiméricas e absolutamente inaplicáveis. As boas discussões dão aos operários um senso prático, e aos patrões a chance de explicar, de dar as razões. Essas razões nem sempre serão isentas de interesses apaixonados, mas desarmarão uma parte. – Aliás, é o direito, e não há direito contra o direito.
Deixemos então de lado essas divergências precisas e positivas, baseadas em fatos reais que se solucionarão de maneira diferente em cada caso. Falo, senhores, apenas dessas rivalidades morais, dessas antipatias de classes que não têm por base nenhuma razão precisa e que nascem principalmente da imaginação. Aqui, eu o repito, o remédio não está em nenhuma lei, em nenhuma reforma, em nenhum plano de organização; não está em nenhuma parte senão na boa vontade dos indivíduos. Cabe a cada um curar a si mesmo e os que estão à sua volta. É pelo esforço de todos que esse bem moral supremo, a união das classes ou antes a supressão definitiva das classes, poderá ser obtida.
A primeira coisa a se fazer, senhores, a mais eficaz sem dúvida alguma, é o que fazeis aqui: colocar os livros e a instrução à disposição daqueles que querem se instruir. Não há maior pacificação do que a luz, por mais que digam os defensores da ignorância.
Dizem que as meias-luzes são mais perigosas que a ignorância; mas então concluo que seja necessária ainda mais luz; tudo o que instrui expande o espírito, cura preconceitos, melhora a compreensão da natureza das coisas e de seus limites intransponíveis. Esclarecendo-se as inteligências pelo conhecimento da história, encantando-as com belas obras de imaginação, fornecendo-lhes bons escritos morais sem ênfase e sem mediocridade, evidentemente cura-se ou se diminui muitas irritações surdas e irrefletidas nascidas da ignorância, e de desejos vazios e fúteis de uma imaginação inflamada.
Tudo o que pode destruir e apagar preconceitos recíprocos é um benefício. Então, direi a uns: Tende confiança, não acrediteis que vos querem sempre enganar, não acrediteis que vos querem oprimir; rejeitai, rejeitai velhas desconfianças e paixões antiquadas; aproveitai, sem invejar ninguém, as vantagens que a sociedade coloca em vossas mãos; elevai-vos sem exigir que alguém desça para vos dar o lugar. Direi aos outros: não acrediteis que se quer privar-vos de vossos bens; aproximai-vos, uni vossos esforços numa ação comum, numa livre e verdadeira igualdade. Vós dais aqui, senhores, um perfeito exemplo disso. Espero que esse exemplo seja seguido em toda parte, e que esse honesto e generoso empreendimento se torne para nossa pátria um princípio de concórdia e de paz.
Paul Janet
A lei de progresso explica perfeitamente as aparentes “injustiças sociais” dando a conhecer a justiça e a bondade de Deus aplicadas a Espíritos imortais em suas breves passagens pela vida em corpos carnais, chamada reencarnação.
"A marcha dos Espíritos é progressiva e jamais retrógrada; eles se elevam gradualmente na hierarquia e não descem da categoria a que chegaram. Em suas diferentes existências corporais eles podem descer como homens, mas não como Espíritos. Assim, a alma de um potentado da Terra pode mais tarde animar o mais humilde operário e vice-versa, porque as categorias entre os homens frequentemente estão na razão inversa da elevação dos sentimentos morais. Herodes era rei, e Jesus carpinteiro.” Allan Kardec6
1. A Bibliothèque Populaire de Versailles foi oficialmente inaugurada em 15 de dezembro de 1864, num local modesto, mobiliado com uma mesa e duas cadeiras e inicialmente recebia os leitores duas horas por dia. Era administrada por uma Sociedade dirigida pelo Sr. Édouard Charton, um de seus principais fundadores.
2. Traduzido do francês por Terezinha Colle.
3. Talvez seja essa escola que influencia alguns legisladores de hoje, que não querem punir os infratores, os criminosos, esquecidos de que a liberdade moral impõe responsabilidades e que a a imputação de penas aos infratores é a única maneira de manter a ordem numa sociedade. (N.T.)
4. Esse pensamento é notado nos países com políticas populistas, paternalistas, protecionistas.
5. A questão da desigualdade das aptidões é fácil e logicamente compreendida pela lei da reencarnação, constatada e ensinada pela Ciência Espírita, por Allan Kardec.
6. O Livro dos Espíritos - Parte Segunda - Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos, cap. IV - Da pluralidade das existências -Transmigrações progressivas, item 194.
___________
O discurso acima foi extraído da
Revue des Cours Litteraires de la France et de l’étranger (Pág. 42)
Collége de France – Sorbonne
ÉCOLE DES BEAUX-ARTS – BIBLIOTHÈQUE IMPERIALE
FACULTÉS DES LETRES DES DÉPARTEMENTS – SOCIÉTÉS SAVANTES UNIVERSITÉS ÉTRANGÈRES
SOIRÉES LITTÉRAIRES DE LA SORBONNE ET DES VILLES DE PROVINCE
CONFÉRENCES LIBRES
___________________
DIRECTIONS: MM. EUG. Yung et Em. ALGLAVE
CINQUIÈME ANNÉE
1867 – 1868
|
|
|
|
|
|